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Indígenas refugiados vivem em espaço recriado em Pacaraima

Débora Brito/Marcelo Camargo/ Enviados Especiais/Agência Brasil

(Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Em meio aos venezuelanos que ingressaram no município de Pacaraima (RR) nos últimos dois anos, estão centenas de indígenas da etnia Warao. Vindos do Delta do Orinoco, Nordeste da Venezuela, desde 2016, os indígenas passaram a viver na cidade fronteiriça. Para abrigá-los, há nove meses foi criado um espaço próprio: o abrigo Janokoida, palavra que, em Warao, significa “casa”.

O local faz lembrar os espaços que os indígenas ocupavam na Venezuela: há um redário – local onde ficam as redes para dormir – e fogão à lenha. O esforço é para que as tradições e a cultura não se percam. Ao contrário dos abrigos para os imigrantes não indígenas, em que são oferecidas três refeições diárias, no Janokoida, os acolhidos preparam os pratos.

“Nos abrigos indígenas, duas vezes por semana, são distribuídos os alimentos para que preparem sua própria comida da forma tradicional. Isso também auxilia para que eles não fiquem aqui de forma só recipientes dessa ajuda humanitária e faz com que eles mantenham os vínculos culturais e sociais”, afirmou o coordenador do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) em Pacaraima, Rafael Levy.

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Indígenas venezuelanos, da etnia Warao, são acolhidos no abrigo Janokoida, em Pacaraima.
Indígenas venezuelanos são acolhidos no abrigo Janokoida (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Com capacidade para 250 pessoas, o abrigo tem atualmente 423 indígenas acolhidos, dos quais 91 têm laços familiares. Muitos voltaram para a Venezuela para buscar outros parentes. Metade dos abrigados é formada por crianças.

A gestão do abrigo é da Secretaria de Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes), sob comando do Ministério do Desenvolvimento Social, como apoio do Acnur e da organização não governamental Fraternidade.

Integração

Na tentativa de ajudar no processo de adaptação, a administração do abrigo promove ações socioeducativas, incetiva a prática de vôlei e futebol e há aulas de português, espanhol, história, educação cidadã, além de orientações sobre higiene e saúde.

A coordenadora do abrigo, Socorro Maria Lopes, disse que a meta é integrar o indígenas da etnia Warao à comunidade local. “Nós trabalhamos com eles autonomia e protagonismo para tirá-los da questão da mendicância.”

No grupo de 423 abrigados, estão sete são caciques que auxiliam na organização e mobilização dos indígenas para as atividades. Alguns têm vínculos com o comércio local, prestam serviços à comunidade ou trabalham na agricultura.

As mulheres se dedicam a manter a tradição do artesanato e estão sendo capacitadas a transformar o talento em fonte de renda. Maria Jimenez, 48 anos, é uma das artesãs. Há três meses no Brasil, ela disse que quer se profissionalizar. “O artesanato é o trabalho principal dos Warao porque aqueles antigos não puderam estudar de verdade.”

Para Maria Jimenez, o fato de ter comida, atendimento de saúde e um local para dormir é comemorado. “Aqui estamos bem. A comida é doada e cuidam de nós, lá não temos o que comprar”, disse. Porém, ela se emocionou ao lembrar da violência contra os compatriotas, há uma semana, em Pacaraima. “Nós, os Warao, sentimos muita dor por eles [os imigrantes agredidos]. Nós somos refugiados e, se estivéssemos em outro lugar, que teríamos passado?”

Indígenas venezuelanos, da etnia Warao, são acolhidos no abrigo Janokoida, em Pacaraima.
Abrigo Janokoida acolhe atualmente 423 indígenas  (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Sonho

Apesar de também fazer artesanato desde pequena, Cisa Borjas, 47 anos, sonha em ser educadora de crianças, como fazia na Venezuela. Em Pacaraima há três meses, depois de passar uma semana viajando de ônibus e carona, ela contou ter visto crianças adoecendo e outras morrendo por causa das dificuldades em que viviam.

Alguns parentes de Cisa Borjas já estavam no Brasil. Depois dos protestos do último sábado (18), que culminaram em atos de violência entre brasileiros e venezuelanos, a filha dela decidiu voltar para a Venezuela. Mas a artesã não pretende voltar, apesar de sentir muita falta da terra de origem.

“Eu gosto daqui. Eu quero viver da minha arte e trabalhar na escolinha das crianças. Isso me encanta, o pouquinho que sei quero ensinar”, disse.

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