Brasil perde 30 mil policiais militares em dez anos, aponta pesquisa
Levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra que o efetivo das PMs caiu 6,8% entre 2013 e 2023. Especialistas alertam para os impactos na segurança pública e na qualidade do trabalho policial.
O Brasil tem hoje 404.871 policiais militares, responsáveis pelo policiamento ostensivo e pela preservação da ordem pública. Esse número representa uma queda de 6,8% em relação ao efetivo que o país tinha em 2013, quando havia 434.248 PMs. A redução de quase 30 mil policiais em uma década foi revelada pelo Raio X das Forças de Segurança Pública do Brasil, um levantamento feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e divulgado nesta terça-feira (27).
A pesquisa também mostra que o efetivo das polícias civis, responsáveis pela investigação de crimes e pela elucidação de casos, também diminuiu no mesmo período. Em 2023, havia 95.908 policiais civis no país, 2% a menos do que em 2013, quando havia 97.894. Já o número de peritos criminais, responsáveis pela perícia técnica e científica, aumentou 9,5%, passando de 16.415 para 17.991.
Os dados do FBSP foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação junto às secretarias estaduais de segurança pública e às polícias militares e civis de todo o país. O levantamento considerou o efetivo existente, ou seja, o número de policiais em atividade, e não o efetivo previsto, que é o número de vagas criadas por lei. Segundo o FBSP, o efetivo previsto para as PMs é de 584.462, o que significa que o país tem apenas 69,3% das vagas preenchidas.
Causas e consequências
As razões para a diminuição do efetivo das polícias variam de acordo com cada estado, mas alguns fatores são comuns, como a falta de concursos públicos, a aposentadoria de policiais, a evasão de profissionais e a crise fiscal que afeta os governos. Além disso, a pandemia de covid-19 também contribuiu para a redução do contingente policial, já que muitos agentes foram afastados ou morreram em decorrência da doença.
A queda no número de policiais tem impactos diretos na segurança pública e na qualidade do trabalho policial, segundo especialistas. Para Samira Bueno, diretora-executiva do FBSP, a redução do efetivo compromete a capacidade de resposta das polícias e aumenta a sobrecarga e o estresse dos profissionais que permanecem na ativa.
“É preciso lembrar que a segurança pública é um serviço essencial, que não pode parar. Com menos policiais, há menos condições de atender às demandas da população, de prevenir e reprimir crimes, de investigar e solucionar casos. Isso gera uma sensação de impunidade e de insegurança, que afeta a todos. Além disso, os policiais que estão na linha de frente ficam mais expostos a situações de risco, de violência, de adoecimento físico e mental. Isso prejudica a saúde e o bem-estar dos profissionais e de suas famílias”, afirma.
Para Renato Sérgio de Lima, presidente do FBSP, é preciso repensar o modelo de gestão das polícias e investir em políticas de valorização e de qualificação dos profissionais. Ele defende que as polícias sejam mais transparentes e prestem contas à sociedade sobre o seu efetivo, o seu orçamento e os seus resultados.
“Não basta apenas aumentar o número de policiais, é preciso também melhorar a forma como eles são distribuídos, capacitados e remunerados. É preciso também garantir que eles tenham condições adequadas de trabalho, com equipamentos, viaturas, armamentos e coletes à prova de balas. É preciso também fortalecer o controle interno e externo das polícias, para evitar desvios de conduta e abusos de autoridade. E é preciso também estimular a integração entre as polícias e entre os órgãos de segurança pública, para que atuem de forma coordenada e eficiente”, diz.
Desafios e propostas
O cenário de redução do efetivo das polícias impõe desafios e demanda propostas para a melhoria da segurança pública no país. O FBSP apresentou algumas sugestões, baseadas em evidências científicas e em boas práticas nacionais e internacionais, que podem contribuir para a reversão desse quadro. Entre elas, estão:
- Realizar concursos públicos periódicos e adequados à demanda de cada estado, considerando o déficit de pessoal, a taxa de evasão, a taxa de aposentadoria e a taxa de mortalidade dos policiais;
- Revisar os critérios de seleção e de formação dos policiais, priorizando as competências técnicas, comportamentais e emocionais necessárias para o exercício da função;
- Implementar políticas de valorização e de reconhecimento dos policiais, oferecendo salários dignos, planos de carreira, promoções, gratificações e benefícios;
- Promover a saúde e o bem-estar dos policiais, disponibilizando serviços de assistência médica, psicológica e social, além de programas de prevenção e de tratamento de doenças ocupacionais, como o estresse, a ansiedade e a depressão;
- Reduzir o número de policiais em atividades administrativas ou em funções que não sejam de sua competência, como a segurança de autoridades, a guarda de presídios e a fiscalização de trânsito, liberando esses profissionais para o policiamento ostensivo e a investigação criminal;
- Estimular a participação das mulheres nas polícias, ampliando as vagas e as oportunidades para elas, que hoje representam apenas 12,8% do efetivo das PMs e 25,8% do efetivo das polícias civis;
- Adotar o uso de tecnologias que possam otimizar o trabalho policial, como câmeras corporais, drones, tablets, aplicativos e sistemas de informação e de inteligência;
- Fortalecer a articulação entre as polícias e entre os órgãos de segurança pública, como o Ministério Público, o Poder Judiciário, a Defensoria Pública, o sistema penitenciário e o sistema socioeducativo, para garantir uma atuação integrada e efetiva;
- Ampliar o diálogo e a cooperação entre as polícias e a sociedade civil, buscando a aproximação, a confiança e a legitimidade das instituições policiais junto à população.