Voluntariado: Uma história inspiradora na educação
Há cinco anos, a jovem Wannya Cipriano, de 32, trabalha como auxiliar voluntária em uma escola pública de Maceió. Amante da sala de aula, duas vezes por semana acompanha a irmã Walkíria, de 43, à escola municipal Padre Brandão Lima, onde Walkíria é professora de Atendimento Educacional Especializado (AEE) para estudantes com deficiência. “Wannynha”, como é carinhosamente conhecida na comunidade escolar, segue as atividades pedagógicas realizadas com uma turma de dez alunos da educação especial. Sua rotina escolar com os pequenos é marcada por jogos educativos, brincadeiras e generosas doses de afeto.
Essa história poderia ser apenas mais uma de voluntariado no Brasil, não fosse por um detalhe: Wannynha tem síndrome de Down. Nascida na pequena cidade de Coroatá, no interior do Maranhão, onde, à época, pouco se sabia sobre o que significava ser Down, Wannya sempre buscou ter autonomia e nunca permitiu que a deficiência se tornasse um empecilho em sua vida. Apesar dos desafios que envolvem todo tipo de deficiência, sua condição nunca foi sinônimo de limitação ou renúncia. Muito pelo contrário: ao longo de toda sua vida, recebeu estímulo da família, amigos e professores para superar suas dificuldades.
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Quando concluiu o ensino médio em uma escola particular, Wannynha não sabia qual rumo profissional seguir. Diante da indecisão da irmã, a professora Walkíria sugeriu que ela realizasse trabalho voluntário na escola onde trabalha. Aceito o desafio, ela se dispôs a ajudá-la no processo de escolarização e inclusão dos estudantes com deficiência. Como resultado dessa iniciativa, nasceu um amor incondicional pela educação inclusiva, ancorado em um sentimento de pertencimento ao trabalho que, sem grandes pretensões, surgira em sua vida. Dentre as atividades desenvolvidas, a voluntária ensina o alfabeto de maneira lúdica, aplica jogos de raciocínio lógico e oferece apoio complementar na unidade de ensino, sempre com o apoio da irmã Walkíria.
Inclusão
Walkíria conta que sua irmã gosta de ensinar desde muito cedo. Apesar de sempre ter estudado em escolas particulares, foi na educação pública que ela encontrou seu lugar. “Certa vez, os pais de uma aluna com Down depararam com Wannynha na sala de recursos, acompanhando sua filha nas atividades. Eles nunca a tinham visto por lá. Ficaram paralisados, sem reação. Emocionados, eles olhavam para ela como uma real esperança para sua filha. Foi emocionante”, relembra a professora.
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Wannynha lembra outra situação que viveu quando começou a trabalhar na escola e quis estar mais próxima de um aluno em particular. O menino, que também tem síndrome de Down, não apresentava muitos avanços. Com a chegada da voluntária e o apoio do guia e das formações continuadas, a criança mostrou, aos poucos, importantes evoluções no aprendizado e na interação com os colegas de turma. “Eu me sinto muito feliz na sala de aula. Gosto de ensinar meus alunos. Eles são aplicados e, com paciência e dedicação, podem progredir muito. É um grande desafio”, diz Wannynha.
Os dois estudantes com síndrome de Down que marcaram a trajetória de Wannynha estão entre os 2.318 alunos com deficiência matriculados na rede municipal de ensino de Maceió. Eles recebem Atendimento Educacional Especializado (AEE) em Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) – como os espaços onde as irmãs Cipriano trabalham. Ao todo, segundo dados do Sistema para Administração e Controle Escolar (SisLAME), 3.168 alunos com deficiência foram matriculados na rede municipal de ensino da capital em 2018, quase o dobro do número registrado em 2014 (1.981). O aumento gradativo é observado desde a implementação da matrícula online, em 2015, conforme dados do SisLAME.
Diante da necessidade de Wannynha e dos demais professores de AEE em qualificar o atendimento pedagógico oferecido ao grande número de estudantes com deficiência, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a Secretaria Municipal de Educação de Maceió (SEMED) promoveram, em junho deste ano, a Semana da Inclusão. A iniciativa foi uma oportunidade para discutir com professores de AEE, especialistas, educadores e representantes de conselhos e associações, por meio de oficinas e palestras, conceitos e referenciais metodológicos sobre escolarização e currículo diferenciado. Em três dias de programação, cerca de 300 pessoas participaram.
Futuro
Depois da experiência na escola Padre Brandão Lima, que acabou se transformando em seu sentido de vida, Wannynha tem grandes planos para o futuro. De acordo com a voluntária, o carinho de pais, alunos e educadores nutrem ainda mais o amor pela profissão que escolheu. Aos 32 anos, segura da carreira a seguir, ela ingressou recentemente no curso de Pedagogia e conseguiu um trabalho como auxiliar pedagógica em uma escola canadense bilíngue.
Num futuro próximo, pretende se casar com seu namorado, ter filhos e sua própria casa. Já preocupada com a educação dos pequenos, os planos incluem ser a professora da escola onde estudarão. Não satisfeita, ela ainda participa de grupos sociais pró-inclusão, se envolve em discussões sobre a temática, participa das formações continuadas da rede e já ministrou palestra.
PNUD em Maceió
O Guia das Orientações Curriculares da Educação Especial para a Inclusão foi fundamental para a capacitação da voluntária Wannynha e tem sido instrumento importante nos processos formativos dos professores de AEE. O documento foi desenvolvido a partir do plano de cooperação técnica entre a pasta municipal de Educação e o PNUD, iniciado em 2014. A publicação veio em 2016.
O objetivo do guia é orientar professores de AEE, estimular e fomentar a implementação de ambientes inclusivos para os estudantes com deficiência nas escolas. É uma espécie de manual que orienta de forma muito prática como a escola pode trabalhar com esse perfil de aluno.
“Em 2016, junto com o Departamento da Educação Especial e com algumas escolas da rede, iniciamos um processo de elaboração dos dados e das orientações curriculares para inclusão. O resultado desse trabalho resultou em uma publicação importante para a rede, pois consegue sistematizar todo o arcabouço legal do sistema educacional. Esse processo pode fazer com que as escolas sejam espaços de inclusão, um lugar onde o diferente possa ser considerado uma pessoa que precisa de mais sociabilidade, tolerância e solidariedade. O guia é importante porque orienta a gestão escolar a saber como ela deve se comportar em relação às pessoas com deficiência, pois é claro que não é nada fácil poder incluir crianças com diferentes necessidades. Cada criança é única, e sua forma de aprender também”, enfatiza a coordenadora-geral do projeto SEMED/PNUD, Rita Ippolito.
Na visão da coordenadora da Educação Especial da Secretaria, Cláudia Valéria, a escola deve organizar-se para receber todos os alunos e ser capaz de reconhecer e valorizar as diferenças, quebrando paradigmas. “A inclusão escolar e profissional da pessoa com deficiência é possível e já é realidade em nossa rede de ensino de Maceió. Wannynha é prova de que, quando a escola, a família e a sociedade valorizam a diversidade humana e a aceitação das diferenças individuais como um atributo, não como um obstáculo, garante-se o direito da pessoa com deficiência de frequentar e usufruir do espaço escolar de forma estimulante e enriquecedora.”
A gestora ressalta a importância do PNUD nesse trabalho de fortalecimento da política de inclusão em Maceió, com a elaboração de relatórios baseados em estudos de caso, planos de aula de referência e proposta curricular da política de inclusão da rede. O plano também prevê envolver professores de AEE em oficinas pedagógicas, a fim de traçar um diagnóstico conjunto da educação especial no município.
“Nossa rede, com a parceria de instituições conveniadas e do PNUD, vem oportunizando, assessorando e discutindo questões referentes ao universo da educação especial, capacitando nossos profissionais por meio de oficinas, assessorias e capacitações. O Guia da Educação Especial vem para nortear esse esforço coletivo de proporcionar o acesso e a permanência significativa da pessoa com deficiência no ambiente escolar”, afirma Valéria.
A analista de programa do PNUD responsável pelo projeto, Maria Teresa Amaral Fontes, destaca que o direito à educação inclusiva foi formalmente reconhecido no âmbito dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, lançados em 2015.
A parceria com a SEMED e a iniciativa de promover a educação inclusiva encontram respaldo no ODS 4 — “Garantir a educação inclusiva de qualidade e equitativa e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos” — e sua meta 4.5 — “eliminar as disparidades de gênero na educação e garantir a igualdade de acesso a todos os níveis de educação e formação profissional para os mais vulneráveis, incluindo as pessoas com deficiência, povos indígenas e as crianças em situação de vulnerabilidade”.
A analista reforça ainda que o direito à educação inclusiva está previsto em convenções internacionais ratificadas pelo Brasil, em leis nacionais que tratam dos direitos das pessoas com deficiência e no Plano Nacional da Educação. “A universalização da educação especial é ainda um grande desafio, mas são iniciativas como essa implementada por meio da parceria SEMED/PNUD que nos fazem acreditar que estamos no caminho certo”, comemora.
Lápis e cadernos podem não mudar o mundo, mas, certamente, são ferramentas preciosas que podem representar o início de toda grande transformação social, que já acontece na rede de Maceió.
*com informações da ONU Brasil. Conheça o site clicando aqui