Como a eleição municipal de São Paulo pode influenciar 2022
Em ano de eleições municipais no Brasil, os olhos se voltam, invariavelmente, para a disputa em São Paulo (SP). Isso porque o pleito do maior município brasileiro acaba, de alguma forma, refletindo a política nacional, criando a expectativa sobre o cenário das próximas eleições presidenciais. Em 2020, a capital paulista tem 14 candidatos na disputa – e uma direita bastante fragmentada.
Os perfis dos candidatos que se encontram mais à direita no espectro político são diversos. Há nomes mais tradicionais e bastante conhecidos dos paulistanos, como o poulista Celso Russomanno (Republicanos) e Andrea Matarazzo (PSD), e aqueles ligados a grandes partidos na cidade, caso do candidato à reeleição, Bruno Covas (PSDB), apoiado pelo governador João Doria. Há, ainda, os que ainda tentam se vender como “nova política”, como Filipe Sabará (Novo), Arthur “Mamãe Falei” do Val (Patriota) e Joice Hasselmann (PSL).
Paralelamente, na esquerda, o PT lançou Jilmar Tatto na corrida, mas as atenções dos eleitores desse campo têm se voltado para Guilherme Boulos (PSOL), explicitando a persistência do desgaste petista.
Coordenadora da Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade Federal do ABC (UFABC), Vanessa Elias de Oliveira comenta que, historicamente, a direita sempre teve uma “oferta” maior de candidatos nos pleitos municipais quando comparada a esquerda. É preciso lembrar, afirma a pesquisadora, que o brasileiro costuma votar mais à direita em eleições municipais, o que aumenta as chances de vitória de um nome com esse posicionamento político, mas, também, a concorrência.
“O veto às coligações proporcionais explica em parte esse aumento [de candidatos], pois incentiva os partidos a lançarem nomes para cargos majoritários e, com isso, puxarem votos para cargos proporcionais”, pontua.
A respeito dessa fragmentação mais acentuada, Vanessa afirma que ela ocorreu muito graças ao Bolsonarismo e seus conflitos internos. Não é surpresa, portanto, que muitos nomes, mesmo conservadores, apresentem-se como oposição ao atual presidente, disputando eleitores que possam ter se frustrado com a atual gestão do Governo Federal.
Somado a isso, há o fato de Bolsonaro não ter assumido uma postura muito ativa no primeiro turno das eleições municipais, o que leva diversos partidos a tentarem assumir a hegemonia da direita no Brasil. O próprio presidente, quando eleito em 2018, era um outsider filiado ao PSL, então um partido nanico. Agora, governa sem legenda.
“Não vemos [o presidente Jair] Bolsonaro assumir um papel de organização direita no Brasil. Ele claramente não tem essa preocupação. Então vira essa ‘terra de ninguém’, com todos querendo assumir esse papel, mas nenhum nome como favorito”, afirma o economista Glauco Peres da Silva, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP).
Votação recorde em 2018, intenções de voto ínfimas em 2020
Dois candidatos que decidiram se lançar na corrida à Prefeitura de São Paulo este ano são nomes que tiveram votação recorde nas eleições para o Legislativo em 2018. Trata-se de Joice Hasselmann (PSL), que teve a segunda maior votação entre os candidatos a deputado federal em São Paulo, e Arthur “Mamãe Falei” do Val (Patriota), eleito com a segunda maior votação para a Assembleia Legislativa de São Paulo. Os dois, inclusive, têm perfis semelhantes: se venderam como rostos da “nova política” e ganharam força por meio das redes sociais. No pleito municipal, contudo, ambos acumulam intenções de voto insignificantes: Arthur tem 2% e Joice, 1%, segundo Pesquisa Ibope divulgada pela Rede Globo e pelo jornal O Estado de S. Paulo na última quinta-feira (15/10).
Na análise de Bruno Lima Rocha, docente de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), nomes como os de Joice e do Val cresceram em uma espécie de comportamento de manada, quando havia um vento a favor das novas caras da direita – além, é claro, da onda de “nova política”.
“Para cargos majoritários, porém, o cenário é outro. Temos a experiência de novatos, como Wilson Witzel (PSC) no Rio de Janeiro e Carlos Moisés (PSL) em Santa Catarina, que foram terríveis. No médio prazo, a tendência para esses políticos é entrar para as oligarquias ou virar uma caricatura com mandatos consecutivos, como o Tiririca. É o caso do Arthur e da Joice. Não deixa de ser um voto de protesto, mas não há tanto fôlego assim. A política é uma maratona. E eles entraram como se ela fosse uma corrida de 100 metros rasos”, opina.
Novas caras para a esquerda
Enquanto à direita os candidatos paulistanos que somam mais intenções são dois nomes ligados à política tradicional – Celso Russomanno (Republicanos), com 25%, e Bruno Covas (PSDB), com 22% –, na esquerda quem desponta é Guilherme Boulos (PSOL), um político jovem, de 38 anos, que nunca exerceu um cargo político e se tornou conhecido do grande público ao se candidatar à Presidência da República em 2018. Nas intenções de voto, para o Executivo da maior cidade brasileira, Boulos aparece em terceiro lugar, com 10%.
E apesar da força que o nome de Lula ainda tem, um bom desempenho de Boulos nas eleições municipais da capital paulista talvez seja um indicativo de que uma possível mudança de guarda no campo da esquerda. Para os especialistas, o que o eleitor da esquerda sinaliza é que chegou o momento de identificar outro partido ou candidato, já que a imagem do Partido dos Trabalhadores (PT) ficou desgastada.
Esse desgaste já vinha desde a própria gestão Lula, com o mensalão, e se intensificou nos últimos anos. Ao mesmo tempo, Vanessa Elias lembra que Boulos trouxe como candidata a vice um nome muito forte da esquerda brasileira, Luiza Erundina, o que demonstra que um apoio mais “tradicional” ainda é importante.
“A renovação é atraente na política, para a esquerda e para a direita, e é importante para a esquerda no atual momento, após derrotas sofridas nos últimos anos. Boulos representa a mudança na esquerda, por um lado, mas traz um nome bastante conhecido junto, o de Erundina”, diz.
“Não à toa conta com o apoio de nomes que historicamente vinculados ao PT [o do cantor Chico Buarque, por exemplo]. Tatto, ao contrário, representa o lado mais desgastado do PT, que parte da esquerda e do próprio partido não aprova”, completa a professora, se referindo a Jilmar Tatto, candidato à Prefeitura de São Paulo pelo PT, que soma 4% das intenções de voto.
Já para Bruno Lima Rocha, ainda que Tatto já tenha exercido cargos públicos anteriormente, neste momento, Boulos é mais conhecido do grande público do que o veterano, muito devido à visibilidade que o novato conquistou na campanha presidencial de 2018, bem como à sua forte presença nas redes sociais.
“Em São Paulo, o Partido dos Trabalhadores estava muito vinculado ao conjunto de problemas do PT nacional. Temos que lembrar também que, especificamente, nomes mais à esquerda tendem a operar em dois níveis: uma base social concreta e outra com uma capacidade de transitar pela Internet política, como bem fazem Boulos e Manuela D’Ávila [que concorre à Prefeitura de Porto Alegre pelo PCdoB]”, salienta.
Por Murilo Basso, da Deutsche Welle