Política

Bolsonaro agora diz que não teve “intenção de agredir” STF

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Jair Bolsonaro, presidente da República, durante discurso em que ataca o STF (Marcos Corrêa/PR)

Depois de ameaçar abertamente o Supremo Tribunal Federal (STF) e pregar desobediência a decisões da Corte durante discursos nos atos de 7 de Setembro, o presidente Jair Bolsonaro divulgou nesta quinta-feira (09/09) uma “Declaração à Nação”, em tom de recuo tático após a má repercussão de suas falas, que tiveram consequências negativas até mesmo na economia.

No texto, o presidente afirma agora que nunca teve “intenção de agredir quaisquer dos poderes. A harmonia entre eles não é vontade minha, mas determinação constitucional que todos, sem exceção, devem respeitar”.

Bolsonaro decidiu divulgar a declaração após aconselhamento do ex-presidente Michel Temer. O presidente enviou um avião para buscar Temer em São Paulo, para que ambos pudessem discutir a crise institucional, que nas últimas horas foi agravada por bloqueios em estradas organizados por caminhoneiros bolsonaristas.

Segundo apurou a emissora CNN Brasil, o ex-presidente teria inclusive redigido ele próprio o texto, assinado por Bolsonaro. Temer teria promovido um contato telefônico entre Bolsonaro e o ministro Alexandre de Moraes do STF, que nomeado para o tribunal durante o governo do emedebista.

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Bolsonaro utilizou o termo “divergências” para expressar sua posição em relação a decisões de Moraes, mas ressalvou que essas questões devem ser resolvidas “por medidas judiciais que serão tomadas de forma a assegurar a observância dos direitos e garantias fundamentais previsto no Artigo 5º da Constituição Federal”.

“Sei que boa parte dessas divergências decorrem de conflitos de entendimento acerca das decisões adotadas pelo Ministro Alexandre de Moraes no âmbito do inquérito das fake news”, observou. “Mas na vida pública as pessoas que exercem o poder, não têm o direito de ‘esticar a corda’, a ponto de prejudicar a vida dos brasileiros e sua economia.”

No ato pró-governo em São Paulo, Bolsonaro chegou a chamar Moraes de “canalha” e disse que não cumpriria mais as decisões do magistrado.

“Dizer a vocês que, qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, este presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou, ele tem tempo ainda de pedir o seu boné e ir cuidar da sua vida. Ele, para nós, não existe mais”, disse o presidente.

“Calor do momento”

Entretanto, no texto divulgado nesta quinta-feira, o presidente afirma que suas palavras, “por vezes contundentes, decorreram do calor do momento e dos embates que sempre visaram o bem comum”, relativizou.

Bolsonaro encerrou a nota com o lema “Deus, Pátria, Família”, originalmente um slogan da Ação Integralista Brasileira (AIB), movimento de viés fascista que atuou no Brasil na década de 1930. Recentemente, Bolsonaro e membros da sua família também usaram o slogan em publicações relacionadas à natimorta Aliança pelo Brasil, o partido que o presidente tentou criar em 2019 e que nunca saiu do papel.

A nota de Bolsonaro foi divulgada após reações enérgicas do presidente do STF, Luiz Fux, e do ministro Luís Roberto Barroso. Fux advertiu na quarta-feira que o desrespeito a decisões da Corte “configura crime de responsabilidade”. Ele também afirmou que a população deve estar atenta aos “falsos profetas do patriotismo” e que o Tribunal não aceitará ameaças. Já Barroso chamou Bolsonaro de “farsante” e disse que o Brasil é “alvo de chacota” no exterior por causa da falta de compostura de Bolsonaro.

Não é a primeira vez que Bolsonaro recua de uma ofensiva contra outros Poderes. Em maio de 2020, ele já havia dito “ordens absurdas [do STF] não se cumprem” durante outro episódio de tensão com o STF, quando o Tribunal apertava o cerco contra bolsonaristas suspeitos de atuarem como divulgadores e financiadores de fake news. Na ocasião, ele adotou um tom mais ameno no dia seguinte, diante da má repercussão das sua falas. O roteiro foi o mesmo em ofensivas contra o STF e governadores nos mais de dois anos de governo Bolsonaro, num padrão repetitivo de ataque e recuo tático, que mobilizou regularmente a base radical bolsonarista no decorrer das crises.

Desta vez, porém, a publicação do texto gerou má repercussão em redes sociais da base extremista do presidente, que esperava que Bolsonaro continuasse a manter a ofensiva contra o STF sem qualquer recuo. Após a publicação da nota, o comentarista bolsonarista Rodrigo Constantino escreveu em seu Twitter: “O sistema declarou guerra ao povo. O presidente sucumbiu ao sistema”. “Bandeira branca”, escreveu o influencer bolsonarista Leandro Ruschel. O mesmo tom se repetiu em publicações de outros ativistas bolsonaristas.

A nota também não convenceu membros da oposição. “Ou Jair Bolsonaro mentiu para seus seguidores no 7 de Setembro ou ele está mentindo para todos os brasileiros com a nota divulgada hoje. O fato é que o presidente não tem palavra, o Brasil não tem governo e Bolsonaro não pode continuar no Palácio do Planalto”, escreveu o deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ).

Enfrentando queda constante de aprovação, economia em crise, pandemia, o fantasma de um apagão energético, insatisfação crescente entre o empresariado e denúncias de corrupção, Jair Bolsonaro usou o 7 de Setembro como uma tenativa de demonstração de força, convocando sua base radical a tomar as ruas contra o STF.

O foco das falas do presidente durante os atos foi especialmente dirigido aos ministros do STF Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso – este também presidente do TSE –, que são com frequência tratados como inimigos pelo presidente e sua base.

Moraes é responsável por diversos inquéritos que afetam bolsonaristas e determinou a prisão de aliados do presidente, como o deputado Daniel Silveira e o presidente do PTB, Roberto Jefferson, que incitaram violência contra ministros do Supremo.

Já Barroso, na condição de presidente do TSE, se opõe à adoção do voto impresso, uma bandeira bolsonarista, encarada como uma forma de minar a confiança no processo eleitoral e tumultuar as eleições de 2022, que se desenham extremamente desfavoráveis para Bolsonaro, segundo pesquisas.

Por Deutsche Welle
rc/jps (ots)

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