MPF denuncia empresários e desembargador por corrupção
O Ministério Público Federal (MPF) apresentou, nesta quarta-feira (15), à Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ), denúncia contra o empresário Jacob Barata Filho e o desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) Mário Guimarães Neto por participação em um esquema de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas no setor de transportes públicos no estado do Rio de Janeiro.
Também constam como denunciados a esposa do magistrado, a advogada Gláucia Iorio de Araújo Guimarães; os empresários Miguel Iskin, José Carlos Reis Lavouras; além do presidente do Conselho Superior do Sindicato Rio Ônibus, e João Augusto Morais Monteiro, e do doleiro Carlos Eduardo Caminha Garibe.
Conhecido como Rei do ônibus, Jacob Barata Filho é um dos maiores empresários de ônibus do Rio de Janeiro e do Brasil, integrando o quadro societário de mais de 25 empresas do ramo dos transportes, e responde a diversas ações penais na Justiça. Miguel Iskin é réu em quase uma dezena de ações na área da saúde, no bojo da Operação Lava Jato do Rio de Janeiro.
A presente apuração é desdobramento das operações Descontrole e Quinto do Ouro, cujo objetivo é aprofundar o desmantelamento da organização criminosa responsável pela prática de crimes relacionados à cobrança de propina sobre grande parte dos contratos administrativos celebrados com o estado fluminense.
No documento enviado ao ministro relator Félix Fischer, a subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo requer a prorrogação do afastamento cautelar do desembargador Mário Guimarães até o trânsito em julgado do processo, em razão do risco de que o investigado intimide testemunhas e use sua influência para macular provas já existentes ou prejudicar as investigações. O MPF pede o recebimento integral da denúncia e, em caso de condenação, a decretação da perda da função pública do magistrado.
Também requer o pagamento solidário, pelos envolvidos, de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 11,5 milhões, correspondente ao montante de dinheiro envolvido nas negociações criminosas, uma vez que os prejuízos decorrentes dos crimes de corrupção e de lavagem de capitais são difusos e deram causa ao descrédito do mais elevado órgão do Poder Judiciário local. Por fim, o MPF defende o perdimento do produto e proveito dos crimes, ou do seu equivalente, também no valor mínimo de R$ 11,5 milhões, atualizado com juros e correção monetária.
Como funcionava o esquema
De acordo com as investigações, os dirigentes da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro (Fetranspor) Jacob Barata Filho, João Augusto Monteiro e José Carlos Lavouras pagaram vantagem indevida no valor de R$ 6 milhões em espécie ao desembargador Mário Guimarães com o propósito de garantir decisão judicial favorável aos interesses dos empresários de ônibus. O acerto da propina foi intermediado pela esposa do magistrado, Gláucia Guimarães, e o pagamento, efetuado com recursos de caixa 2 do Sindicato Rio Ônibus.
Em razão do ajuste, o desembargador efetivamente praticou atos de ofício com infração de dever funcional, proferindo decisões judiciais que beneficiaram as empresas de ônibus em mais de 40 ações civis públicas que objetivavam a realização de licitação das linhas de ônibus pelo município do Rio de Janeiro.
Posteriormente, Mário Guimarães e sua esposa, com auxílio do doleiro Carlos Garibe, entre 2013 e 2019, com o propósito distanciar o dinheiro derivado de crimes de sua origem ilícita, ocultaram e dissimularam a origem, a natureza e a propriedade de cerca de US$ 2,1 milhões, com a manutenção e movimentação de inúmeras contas no exterior, abertas em nome de pessoas físicas e de offshores.
Desse total, US$ 264 mil foram enviados ilegalmente para o exterior por meio de operações de dólar-cabo, modalidade que viabiliza a remessa de dinheiro sujo para o exterior, bem como o ingresso de ativos, de modo oculto.
Colaboração
Entre os temas apresentados pelo colaborador Carlos Garibe, foram relatadas diversas operações de dólar-cabo realizadas pelo doleiro por determinação e em benefício de Gláucia e de seu marido Mário Guimarães. As informações foram corroboradas com apresentação de provas colhidas após pedido de cooperação jurídica internacional com os Estados Unidos e quebra do sigilo telemático da esposa do magistrado. “A partir da análise dos extratos bancários, comprovou-se que Gláucia Guimarães e Mário Guimarães Neto receberam, no exterior, pelo menos, a vultosa cifra de 2.154.797,19 dólares no período compreendido entre 27/09/2013 e 09/07/2019”, detalha Lindôra Araújo.
Por outro lado, a quebra do sigilo bancário de Gláucia Guimarães revelou ainda que, mesmo sem ter qualquer função que justifique o recebimento de valores em espécie, a denunciada recebeu depósitos em espécie no Brasil, entre janeiro de 2012 e abril de 2019, superiores a R$ 1,6 milhão.
Denunciados na ação penal:
• Mário Guimarães Neto (desembargador da 12ª Câmara Cível do TJRJ):
– Corrupção passiva
– Lavagem de dinheiro
– Evasão de divisas
• Gláucia Ioro de Araújo Guimarães (advogada, esposa de Mário Guimarães):
– Corrupção passiva
– Lavagem de dinheiro
– Evasão de divisas
• Carlos Eduardo Caminha Garibe (doleiro)
– Lavagem de dinheiro
– Evasão de divisas
• José Carlos Reis Lavouras (empresário)
– Corrupção ativa
• Jacob Barata Filho (empresário)
– Corrupção ativa
• João Augusto Morais Monteiro (presidente do Conselho Superior do Rio Ônibus)
– Corrupção ativa
• Miguel Iskin (empresário, atualmente preso)
– Evasão de divisas
*Conteúdo do MPF