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Uber: Investigação aponta práticas abusivas

Uma investigação divulgada neste domingo (10/07) pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês) aponta que a empresa americana de transporte Uber buscou expandir seus negócios em diferentes países, entre 2013 e 2017, por meio de uma série de ações que podem ser consideradas irregulares.

Ao tentar entrar em mercados estrangeiros, a Uber teria feito, por exemplo, lobby junto a políticos para flexibilizar leis trabalhistas e de táxi, além de ter tentado atrapalhar reguladores e leis, e enviar e manter dinheiro em paraísos fiscais como as Bermudas, no Caribe, fugindo, assim, do pagamento de impostos.

As informações foram obtidas primeiramente pelo jornal britânico The Guardian, que se ofereceu para compartilhá-las com o ICIJ. A rede de jornalismo investigativo pesquisou e analisou mais de 124 mil itens de comunicação interna da Uber a fim de mostrar “um olhar sem precedentes sobre as formas como a Uber desafiou as leis dos táxis e infringiu direitos de trabalhadores”.

Motorista segura aparelho celular diante do volante do carro com o logo da Uber na tela.
(Reprodução)

Entre os lobbies com políticos que mais chamam a atenção estão os das negociações diretas com o então ministro da Economia (2014-2016) e hoje presidente da França, Emmanuel Macron. Conforme a investigação, em 2014 a Uber acreditava que Macron poderia encorajar os reguladores do país a “serem menos conservadores nas interpretações das regras que limitavam as operações da empresa”.

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Após a divulgação do relatório, deputados oposicionistas denunciaram o presidente francês, acusando-o de intermediar um acordo secreto com a empresa. Opositores da esquerda francesa falam em “escândalo de Estado” e pregam a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Assembleia Nacional francesa.

Segundo reportagens publicadas pelo jornal Le Monde e pela Radio France, Macron teria agido como uma espécie de relações públicas para convencer o então primeiro-ministro, Bernard Cazeneuve, a facilitar a abertura do mercado de motoristas privados – justamente em uma época em que a França convivia com protestos de taxistas contra a medida.

Procurados por jornalistas da agência de notícias AFP, assessores de Macron disseram que ele manteve contato com a empresa em meio a funções de rotina de suas atribuições ministeriais.

Os assessores afirmaram que o presidente da França, então ministro da Economia, esteve “naturalmente” em contato com “muitas empresas envolvidas em meio às profundas mudanças dos serviços que têm ocorrido ao longo dos anos supracitados, o que deveria ser facilitado por meio da retirada de certos bloqueios administrativos ou regulamentares”.

Além de Macron, a Uber teria tentado praticar lobby direto com outras figuras proeminentes da política mundial, como o presidente americano, Joe Biden, o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, o ex-ministro das Finanças britânico, George Osborne, o ex-primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e o ex-primeiro-ministro irlandês, Enda Kenny.

As denúncias sugerem que a Uber, além de políticos, ministros e assessores, teria cortejado também bilionários, oligarcas e barões da mídia mundial. Ao todo, ao menos 233 personalidades teriam recebido contato da Uber.

Aumento de participação no mercado

Ainda que não esteja totalmente confirmado se a Uber de fato quebrou regras de mercado, o relatório aponta que um verdadeiro exército de lobistas – incluindo vários que atuaram como assessores do ex-presidente dos EUA, Barack Obama – trabalhou de forma hostil para promover a empresa.

David Plouffe, que atuou na Uber entre 2014 e 2017, seria um desses assessores e teria participado de reuniões no Ministério da Economia da França com Macron, que seria favorável à implantação da empresa no país. Plouffe foi diretor da campanha de Obama à presidência dos EUA em 2008.

No caso do chanceler alemão Olaf Scholz, que na época era prefeito de Hamburgo (2011-2018), ele teria resistido aos lobistas e sugerido um salário mínimo para os trabalhadores. Devido a isso, um executivo da empresa teria dito que Scholz seria “um verdadeiro comediante”.

Chamadas de “Uber Files” (Documentos da Uber, em tradução livre), as investigações e as denúncias feitas pelo consórcio de jornalistas apontam que a Uber teria agido por meio de negociações suspeitas em mais de duas dúzias de países.

Em ao menos seis deles, a empresa teria utilizado um sistema chamado “kill switch” para bloquear o acesso aos servidores da companhia durante fiscalizações governamentais, incluindo uma em Amsterdã, após ordem dada pelo diretor executivo na época, Travis Kalanick.

As denúncias também acusam Kalanick de incentivar a violência de taxistas franceses contra motoristas da Uber, movimento que seria visto por ele como uma oportunidade para ganhar apoio dos próprios motoristas contra os taxistas.

Nas Bermudas, um paraíso fiscal localizado no Caribe, a Uber teria canalizado lucros a fim de escapar da cobrança de impostos. De acordo com o relatório, a empresa “tentou desviar a atenção de suas obrigações fiscais ajudando autoridades a cobrar impostos de seus motoristas”.

O que é a Uber?

A Uber é uma empresa de transporte privado, feito em veículos particulares, por meio do qual o motorista controla as próprias corridas. Presente em inúmeros países, a Uber invadiu com sucesso os serviços de táxi, forçando a queda dos preços, retirando concorrentes do mercado e tornando algumas empresas insolventes.

Fundada em 2009, a Uber tem preços de corridas muito mais baixos do que os táxis, o que derrubou os negócios desse setor em muitos países, seja diretamente ou devido a concorrentes regionais e locais.

Empresa se manifesta

Procurada pelos jornalistas, a Uber se manifestou. A porta-voz da empresa, Jill Hazelbaker, comentou sobre as acusações de deslealdade no modelo de negócios. Ela disse que “erros” foram cometidos no passado e que quando o atual diretor executivo, Dara Khosrowshahi, assumiu o posto, em 2017, foi “incumbido de transformar todos os aspectos operacionais da Uber”.

“Quando dizemos que a Uber é uma companhia diferente hoje, queremos dizer literalmente: 90% dos funcionários da Uber entraram na empresa depois que Dara assumiu [o cargo de diretor executivo]”, afirmou Hazelbaker.

gb (AFP, AP, ots)

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