MP-SP quer liminar contra licitação de cinco áreas de pesquisa do Estado
O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) entrou com pedido de liminar na Justiça para suspender uma licitação que pretende conceder, por 15 anos, cinco áreas do Estado dedicadas à pesquisa e à preservação ambiental. O promotor do Meio Ambiente da Capital Carlos Henrique Prestes Camargo diz que, diante da concretização da permissão de uso das áreas, haverá “uma exploração predatória em que o Poder Público se alinha com o empresário florestal e não como protetor do meio ambiente”, escreveu no pedido à Justiça.
A licitação foi aberta este mês e, segundo a Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC), representa uma ameaça grave ao meio ambiente e compromete a realização de estudos científicos. O edital permite que empresas explorem as cinco áreas “visando manejo florestal em áreas de florestas exóticas plantadas e atividades associadas para gestão técnica e comercial, com foco em produtos e subprodutos florestais, para madeira ou resina de pinus e novos plantios comerciais de pinus e/ou eucaliptos”, diz trecho do edital da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente (SIMA).
“A divulgação deste edital é muito preocupante, além de ser escandalosa, por ocorrer justamente no momento em que o ex-governador João Doria é contratado por empresa de papel e celulose, segundo noticia a imprensa brasileira”, alerta Patricia Bianca Clissa, e presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo.
A permissão de uso das cinco áreas vinha sendo discutida desde maio. Em um chamamento público, disponível no site da SIMA, são listadas as Estações Experimentais de Itirapina e Itapeva, além das florestas de Angatuba, Piraju e Águas de Santa Bárbara.
“A consulta pública e o edital divulgado agora confirmam que a permissão de uso vai beneficiar grandes empresas que produzem matéria-prima para papel e celulose, tanto que o tempo de cessão, 15 anos, coincide com o período de dois ciclos de cultivo de eucalipto”, comenta Helena Lutgens, vice-presidente da APqC.
No edital de permissão de uso, o Estado diz que a empresa vencedora deverá “promover ações de apoio e incentivo ao desenvolvimento de projetos e pesquisas cientificas nas áreas objeto desta permissão, seguindo os procedimentos definidos pela Fundação Florestal, Instituto de Pesquisas Ambientais e Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente”.
Ainda assim, a APqC sustenta que todo ecossistema estará ameaçado pela exploração comercial da área.
“Há um contrassenso, porque estas áreas são para experimentação, portanto são peças de pesquisa que serão entregues à iniciativa privada para fazer exploração econômica”, comenta Lutgens.
No pedido de liminar, o MP-SP diz que as áreas estão “em regiões onde ocorre um imenso vazio de conservação com os menores índices de cobertura vegetal nativa do território paulista”. As áreas previstas no edital contam com espécies ameaçadas de extinção, além de serem reservas importantes do bioma cerrado “que é o bioma mais ameaçado no Estado e o que sofreu as mais severas perdas, ficando reduzido a menos de 1% em relação a sua área de ocorrência original.”
“Evidente que a biodiversidade não tem como suportar que essa situação de pressão ecológica seja mantida por 15 (quinze) anos, como consta no Edital”, argumenta o promotor na petição.
Na floresta de Angatuba, por exemplo, habita o mico-leão preto, espécie que chegou a ser considerada extinta por mais de 60 anos. A área, formada por 1,1 mil hectare, é composta por fragmentos de floresta estacional semidecidual. Segundo o Estado, 80% do território são destinados para o plantio experimental de espécies exóticas e nativas.
Já a Estação Experimental de Itirapina, com 3,5 mil hectares, conserva variações de cerrado e de floresta, além de permitir a sobrevivência de dezenas de espécies, incluindo a onça-parda Puma concolor – extinta em várias partes do mundo, pica-pau-chorão e o escorpião-do-sol (Mummucia coaraciandu), até hoje o único aracnídeo Solifugae conhecido no estado de São Paulo.
“Todas estas áreas são objeto de estudo e contam com o olhar técnico de cientistas dos institutos públicos de pesquisa do Estado de São Paulo, o que favorece a preservação. Em caso de cessão às empresas, este olhar voltado para a ciência e o desenvolvimento sustentável de São Paulo será substituído pelo único interesse em produzir lucro, o que é lamentável”, afirma Clissa.